O Rosário e os males do nosso tempo

E hoje, como que acolhendo a mesma voz da amorosíssima Mãe, com a qual ela nos repete: "Clama, nunca te canses", apraz-nos tornar a falar-vos, Veneráveis Irmãos, do Rosário mariano, a esta cara devoção, e que enriquecemos com os tesouros das santas indulgências. A Nossa palavra, todavia, não terá o fim imediato de tributar novos louvores a uma oração já, por si mesma, tão excelente, nem de estimular os fieis a praticá-la com sempre maior fervor; falaremos, antes, de algumas preciosíssimas vantagens que dela podem derivar, o mais possível correspondente às condições e às necessidades dos homens e dos tempos presentes. Porque estamos absolutamente convencidos de que, se a prática do Rosário for retamente seguida, de modo a poder ostentar toda a eficácia que lhe é intrínseca, não somente aos simples indivíduos, mas também a toda a sociedade, trará a maior utilidade.

Sabem todos o quanto Nós, pelo dever do Nosso supremo apostolado, nos temos aplicado a contribuir para o bem da sociedade, e o quanto ainda estamos dispostos a fazê-lo, com o auxílio de Deus. Com frequência temos advertido os governantes a não fazerem e a não aplicarem leis que não sejam conformes à mente divina, norma de suma justiça. E, por outra parte, mais de uma vez temos exortado aqueles cidadãos que, ou por inteligência, ou por méritos, ou por nobreza do sangue, ou por haveres, estão em posição de privilégio em relação aos outros, a defenderem e a promoverem, em união de entendimentos e de forças, os supremos e fundamentais interesses da sociedade.

Mas, na estado presente da sociedade civil, sobejas são as causas que debilitam os ligames da ordem pública e desviam os povos da justa honestidade dos costumes. Todavia, os males que mais perigosamente minam o bem comum parecem-nos ser principalmente os três seguintes: "aversão à vida humilde e laboriosa; o horror ao sofrimento; o esquecimento dos bens futuros, objeto das nossas esperanças".

A aversão ao viver moderno

Lamentamos - e conosco devem reconhecê-lo e deplorá-lo mesmo aqueles que não admitem outra regra senão a luz da razão, nem outra medida afora a utilidade, - lamentamos que uma chaga verdadeiramente profunda tenha ferido o corpo social desde quando se começou a descurar os deveres e as virtudes que formam o ornamento da vida simples e comum. De fato, daí se segue que, nas relações domésticas, os filhos, intolerantes de toda educação que não seja a da moleza e da volúpia, recusam arrogantemente a obediência que a própria natureza lhes impõe. Por esse mesmo motivo os operários se afastam do seu próprio mister, fogem do labor, e, descontentes com a sua sorte, levantam o olhar a metas demasiado altas, e aspiram a uma inconsiderada repartição dos bens.

Ao mesmo tempo dai se segue o afanar-se de muitos que, depois de abandonarem o torrão natal, buscam o bulício e as numerosas seduções da cidade. Por este motivo ainda, veio a faltar o necessário equilíbrio entre as classes sociais; tudo é flutuante; os ânimos são agitados por invejas e rivalidades; a justiça é abertamente violada; e aqueles que foram iludidos nas suas esperanças procuram perturbar a tranquilidade pública com sedições, com desordens e com a resistência aos defensores da ordem pública.

As lições do mistérios gozosos

Pois bem: contra estes males pensamos que se deve buscar remédio no Rosário de Maria, composto de uma bem ordenada série de orações e da piedosa contemplação de mistérios relativos a Cristo Redentor e a sua Mãe. Expliquem-se de forma exata e popular os mistérios gozosos, apresentando-os aos olhos dos fieis como outros tantos quadros e vivas figurações das virtudes. E assim cada um verá que fácil e rica mina eles oferecem de ensinamentos aptos para arrastar com maravilhosa suavidade as almas à honestidade da vida.

Eis diante do nosso olhar a Casa de Nazaré, onde toda santidade, a humana e a divina, colocou a sua morada. Que exemplo de vida comum! Que perfeito modelo de sociedade! Ali há simplicidade e candura de costumes; perpétua harmonia de almas; nenhuma desordem; respeito mútuo; e, enfim, o amor: mas não o amor falso e mendaz, e sim aquele amor integral, que se alimenta na prática dos próprios deveres, e tal que atrai a admiração de todos.

Ali não falta a solicitude de se proporcionar a si mesmos tudo quanto é necessário à vida, mas com o "suor da fronte", e como convém àqueles que, contentando-se com pouco, se esforçam antes por diminuir a sua pobreza do que por multiplicar os seus haveres. E, sobre tudo isto, reina ali a maior serenidade de ânimo e alegria de espírito: duas coisas que sempre acompanham a consciência do dever cumprido.

Ora, estes exemplos de modéstia e de humildade, de tolerância da fadiga, de bondade para com o próximo e de fiel observância dos pequenos deveres da vida quotidiana, e, numa palavra, os exemplos de todas estas virtudes, assim que entram nos corações e nele se imprimem profundamente, certamente produzem nele pouco a pouco a desejada transformação dos pensamentos e dos costumes.

Então os deveres do próprio estado não mais serão nem descurados nem considerados enfadonhos, mas serão, antes, agradáveis e deleitáveis; e a consciência do dever, imbuída de senso de alegria, será sempre mais decidida no obrar o bem.

Por consequência, os costumes tornar-se-ão mais brandos sob todos os aspectos; a convivência familiar transcorrerá no amor e na alegria; as relações com os outros serão pautadas por um maior respeito e caridade. E, se estas transformações se estenderem dos indivíduos às famílias, às cidades, aos povos e às suas instituições, é fácil ver que imensas vantagens devam daí derivar para a sociedade inteira.


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Papa Leão XIII
CARTA ENCÍCLICA LAETITIAE SANCTAE
SOBRE O ROSÁRIO DE NOSSA SENHORA

O Cântico de Maria
O Cântico de Maria

A partir de um chamado forte ao meu coração de deixar-me ser mais envolvido aos cuidados de Deus, como que respondendo um novo sim ao Projeto do Reino surgiu então O Cântico de Maria.

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