Mãe, vem nos ensinar a fazer da vida uma oblação

Este canto evidencia a forte identificação que o povo alimenta com Nossa Senhora das Dores, sobretudo quando, em prece, levanta sua voz para testemunhar sua fé e profundo sentimento de solidariedade com a dor de Maria ao pé da cruz. Ela é invocada e conhecida também como Nossa Senhora da Piedade ou Nossa Senhora da Soledade. Não há outra imagem de Maria com a qual o nosso romeiro, o nosso povo mais se identifica. Nossa Senhora das Dores é uma força intrínseca que perpassa a vida toda de todas as multidões que fazem sua romaria nos inúmeros santuários espalhados pelo Brasil, pelo nosso Continente, pelo Mundo inteiro, sobretudo na Semana Santa feita nos campos rurais. 

O universo religioso do romeiro é povoado pela imagem de Maria solidária ao pé da cruz até o fim, solidária com seu povo na pessoa das mulheres e de João (cf. Jo 19, 25-27). Essa sua solidariedade desperta a presença do Filho adormecido no coração de cada pessoa e de cada povo. Para o nosso contexto, atualizar a experiência de proximidade com Deus em seu mistério, através da figura de Maria ao pé da cruz encontra seu sentido a partir do momento em que se leva em conta, com profundidade, o mistério da Encarnação, momento em que Maria dá sua adesão a esse plano salvífico do Pai. De fato, ao pé da cruz, Maria contempla, no seu entrever da fé, o Ressuscitado no Crucificado.

Para o nosso povo, que transita muito mais pelo sentimento, pelo coração, pelo afeto e pelas profundas emoções de que é capaz de comunicar e testemunhar para o mundo, Maria ao pé da cruz passa a ter um sentido plenificado a partir do mistério da Encarnação. Por isso, a função materna de Maria se dilata tanto, que assume no Calvário, dimensões universais, passagem inevitável para a glória da exaltação do Cristo ressuscitado. O simbolismo deste evento transporta o romeiro e todo o nosso povo das suas dores para as dores da Mãe. Por isso, o povo canta com ardor e vigor brotados da fé, este canto comovedor: Quando morrias na cruz tua mãe estava ali!

Mas a história humana tem um fim bom que atinge a todos os povos. Nossa Senhora da Glória desponta como a mais forte figura que o povo cultiva e alimenta na Igreja da qual faz parte. A festa da Assunção é celebrada na liturgia que toma a Mulher do para manifestar o sentido e o destino do corpo santificado pela graça. No corpo glorioso de Maria, começa a criação do cosmo ter parte no corpo ressuscitado de Cristo. Maria assunta ao céu é a integridade humana, corpo e alma, que agora intercede pelo povo peregrino na história. Maria nos precede como mulher, na experiência da ressurreição da carne. A fórmula do dogma proclamado por Pio XII em 1950, define claramente: A Imaculada Mãe de Deus, a sempre Virgem Maria, terminado o curso de sua vida terrestre, foi assunta em corpo e alma à glória celeste. O fim da vida de Maria portanto, não se circunscreve nos limites da morte, mas rompe esta barreira e alcança uma plenitude de vida ressuscitada.

A festa da Assunção, mais conhecida como a festa de Nossa Senhora da Glória, nos fala do destino final a que todos somos chamados. Não somos prisioneiros de um corpo mortal, mas seremos resgatados e assumidos no absoluto de Deus em seu mistério de amor. O que se deu em Maria desde o nascimento até a Assunção é uma antecipação paradigmática daquilo que Deus deseja realizar em cada ser humano. 

A singularidade da Assunção de Maria não é pois, de modo algum, um privilégio excludente, mas antes uma realidade inclusiva, que nos ensina a fazer da vida uma oblação em direção a casa do Pai. Por isso, o caminho de Maria, como se afirma acima, está inserido a toda a humanidade salva em Cristo. A festa anual de 15 de agosto faz o povo cantar com saudades, a antecipação da glória celestial: Com minha Mãe estarei, na santa glória um dia! 


*Prof. Lina Boff

O Cântico de Maria
O Cântico de Maria

A partir de um chamado forte ao meu coração de deixar-me ser mais envolvido aos cuidados de Deus, como que respondendo um novo sim ao Projeto do Reino surgiu então O Cântico de Maria.

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